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Sermos consumidores é tudo o que sabemos fazer

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Sermos consumidores é tudo o que sabemos fazer

As alterações climáticas exigem que consumamos menos, mas sermos consumidores é tudo o que sabemos fazer. As alterações climáticas não são um problema que possa ser simplesmente resolvido alterando o que compramos — um híbrido em vez de um todo‑o‑terreno, algumas compensações de carbono quando viajamos de avião. O seu cerne é uma crise resultante do consumo excessivo das pessoas comparativamente ricas, o que significa que os consumidores mais frenéticos vão ter de consumir menos para que os outros possam ter o suficiente para viver.
O problema não é a "natureza humana", como nos é dito tão frequentemente. Não nascemos a ter de fazer assim tantas compras e, no passado recente, éramos igualmente felizes (em muitos casos, mais felizes) a consumir significativamente menos. O problema é o papel excessivo que o consumo acabou por desempenhar na nossa era em particular.
O capitalismo tardio ensina-nos a criarmo-nos através das nossas escolhas como consumidores: a fazer compras é como formamos a nossa identidade, encontramos a nossa comunidade e nos exprimimos. Assim, dizer às pessoas que não podem fazer tantas compras quantas querem porque os sistemas de suporte do planeta estão sobrecarregados pode ser interpretado como uma espécie de ataque, o que equivale a dizer-lhes que não podem ser verdadeiramente elas próprias. Provavelmente, esta é a razão pela qual dos “três erres” originais do ambientalismo (reduzir, reutilizar, reciclar), só o terceiro se implantou significativamente, já que nos permite continuar a comprar, desde que ponhamos o que já não queremos no contentor certo. Os outros dois, que requerem que consumamos menos, morreram praticamente à nascença.

As alterações climáticas são lentas, mas nós somos rápidos

Quando estamos a atravessar rapidamente uma paisagem rural num comboio a alta velocidade, dá a impressão de que tudo aquilo por que estamos a passar está parado: pessoas, tratores, carros em estradas de província. Não estão, claro. Estão em movimento, mas a uma velocidade tão reduzida em comparação com a do comboio que parecem estáticos.
Passa-se o mesmo com as alterações climáticas. A nossa cultura, alimentada pelos combustíveis fósseis, é aquele comboio rápido, a avançar a alta velocidade para o próximo relatório trimestral, o próximo ciclo eleitoral, o próximo entretenimento ou motivo de validação pessoal através dos nossos telemóveis e tablets. O nosso clima em mudança é como a paisagem que vemos pela janela do comboio: de onde nos encontramos em alta velocidade, pode parecer estático, mas está em movimento, com o seu avanço lento medido em placas de gelo a desaparecerem, inundações e aumentos significativos da temperatura. Se não as controlarmos, as alterações climáticas com toda a certeza acelerarão o suficiente para captar a nossa atenção dispersa — ilhas a desaparecerem do mapa e tempestades a inundarem cidades tendem a consegui‑lo. Contudo, nesta fase pode ser já demasiado tarde para que os nossos atos façam diferença porque, provavelmente, a era dos momentos críticos terá já começado.

Naomi Klein
O mundo em chamas
Editorial Presença, 2020

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