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Era pouco maior do que minha mão: por isso eu precisei das duas para segurá-la, 13 anos atrás.
E, como eu não tinha muito jeito, encostei-a ao peito para que ela não caísse, simples apoio nessa primeira vez.
Gostei desse calor e acredito que ela também.
Dias depois, quando abriu os olhinhos, olhou-me fundamente: escolheu-me para dono.
Pior: me aceitou.
Foram 13 anos de chamego e encanto.
Dormimos muitas noites juntos, a patinha dela em cima do meu ombro.
Tinha medo de vento. O que fazer contra o vento?
Amá-la — foi a resposta e também acredito que ela entendeu isso.
Formamos, ela e eu, uma dupla dinâmica contra as ciladas que se armam.
E também contra aqueles que não aceitam os que se amam.
Quando meu pai morreu, ela se chegou, solidária, encostou sua cabeça em meus joelhos, não exigiu a minha festa, não queria disputar espaço, ser maior do que a minha tristeza.
Tendo-a ao meu lado, eu perdi o medo do mundo e do vento.
E ela teve uma ninhada de nove filhotes, escolhi uma de suas filhinhas e nossa dupla ficou mais dupla porque passamos a ser três.
E passeávamos pela Lagoa, com a idade ela adquiriu "fumos fidalgos'; como o Dom Casmurro, de Machado de Assis.
Era uma lady, uma rainha de Sabá numa liteira inundada de sol e transportada por súditos imaginários.
No sábado, olhando-me nos olhos, com seus olhinhos cor de mel, bonita como nunca, mais que amada de todas, deixou que eu a beijasse chorando.
Talvez ela tenha compreendido.
Bem maior do que minha mão, bem maior do que o meu peito, levei-a até o fim.
Eu me considerava um profissional decente.
Até semana passada, houvesse o que houvesse, procurava cumprir o dever dentro de minhas limitações.
Não foi possível chegar ao gabinete onde, quietinha, deitada a meus pés, esperava que eu acabasse a cronica para ficar com ela.
Até o último momento, olhou para mim, me escolhendo e me aceitando.
Levei-a, em meus braços, apoiada em meu peito.
Apertei-a com força, sabendo que ela seria maior do que a saudade.
CONY, Carlos Heitor. In: As Cem Melhores Crónicas Brasileiras, pp. 271-272.
Fonte: Armazemdetexto.blogspot.com/2018/12/cronica-mila-carlos-heitor-cony...
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