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O sol quase desaparecia no horizonte.

Fluo voltou para o seu ramo habitual e reparou que os vizinhos se afastavam dele...

— O que se passa, amigos? Cheiro mal? Pisei a cauda de alguém?

Ninguém respondeu, mas os outros corvos trocaram olhares cúmplices.

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— Uma imagem com árvore, planta, rebanho

Bem, boa noite! — acrescentou Fluo.

Já dormiam quando, de repente, deflagrou um incêndio.

Numa grande agitação de bater de asas e de muitos pios, todo o grupo voou e juntou-se numa outra árvore.

— É por causa do Fluo! — atirou um descontente. — Ele faz com que reparem sempre em nós!

Sozinho no seu ramo, Fluo fazia o possível por desaparecer, encolhendo-se, baixando-se, mas a sua plumagem multicolor iluminava esse dia cinzento de novembro.

Tudo isso fazia com que ele se sentisse muito mal!

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Romualdo, o líder dos corvos, pôs-se à beira dele e tossicou discretamente.

— Oh, assustaste-me! — disse Fluo, sobressaltado.

— Nós não te queremos nenhum mal — garantiu Romualdo —, só que tu não és como nós, não és todo negro!

— Mas... o que posso fazer, Romualdo?

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— Absolutamente nada, desde que vás embora!

— Ir embora para onde?

— Para um sítio qualquer... Mas isso não nos diz respeito!

Fluo abriu as asas e partiu, sem nada dizer.

Nunca antes partira ao acaso, para outro sítio… E não sabia para onde ir nem que direção seguir!

Depois de um grande voo, pousou num telhado.

— Olá! — disse uma rola. — Espero que não fiques aqui!

— Por que razão? Também não te agrado?

— Que ideia absurda! Claro que sim! Mas creio que o telhado é muito frágil — disse ela, arrulhando amigavelmente.

— Pouco importa! Temos todo o telhado para nós!

— É um engano — respondeu a rola, num tom já menos amável. — Se eu estivesse no teu lugar, ia-me embora!

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"Afinal, nada é mais prejudicial do que viver nos telhados no meio dos fumos das chaminés," disse Fluo para si próprio. "Existe, de certeza, outro lugar onde me queiram bem!"

"Ah, uma floresta! Aqui, pelo menos, respira-se ar puro!"

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E logo se dirigiu para um grande pinheiro frondoso.

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— Foi convidado? — resmungou uma voz estranha e fanhosa.

— Eu? Eu não, porquê? — respondeu o corvo, surpreendido.

Dos ramos da árvore emergiram umas penas com um olhar ríspido.

— Quem és? — inquietou-se Fluo.

— O guardião deste pinheiro — disse o pássaro. — E tu?

— Sou um corvo sem casa! — retorquiu Fluo.

— Vejo que és um corvo com muitas cores... Mas toda a gente sabe que os corvos são negros!

— É por isso que estou aqui — suspirou Fluo. — Em minha casa não me querem! Podemos partilhar esta bela árvore espaçosa?

— Sabes, eu tenho os meus hábitos — disse o guardião. — Não quer dizer que os outros me aborreçam, mas resmunga-se, fala-se entredentes, dizem-se disparates, fala-se da vida alheia, tagarela-se e cochicha-se, resumindo... não suporto isso! Enfim, vou ser simpático contigo. Podes ficar aqui esta noite, excecionalmente, porque eu gosto de visitas, sobretudo quando estão de passagem...

Muito antes de o guardião acordar, Fluo seguiu o seu caminho.

Despertou-lhe a atenção uma vedação coberta de pardais que piavam, cheios de energia.

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— Pardais! Eis a companhia de que preciso!

Fluo distanciou-se um pouco para não incomodar.

Uns momentos depois, estava rodeado de pardais.

— Olha! Um corvo multicolor! — exclamou um.

— Há quanto tempo não assustamos um corvo tão bonito? — perguntou outro.

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E, como um enxame de vespas, lançam-se sobre ele.

Fluo teve de abandonar rapidamente a vedação e os seus pardais hostis.

Durante todo o dia voou sem rumo até à exaustão...

Foi então que avistou o mar.

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O mar!!! Não o imaginava tão grande e profundo!

— Aqui, seguramente, existe um pequeno lugar para mim! — pensou Fluo.

Ao longe, surgiu um barco, e Fluo decide embarcar.

— Que maravilha! — disse em alta voz, todo satisfeito. — Vou viajar! Se não posso ser um corvo, vou ser um pirata!

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Na coberta do navio, algumas gaivotas conversavam.

Fluo cumprimentou-as, mas elas nem sequer viraram a cabeça.

— Posso ficar com vocês? — perguntou-lhes.

— Tssss, que impertinência! — disse a que parecia mais velha. — Não vês que pertencemos à nobre raça das prateadas?

— É mesmo típico desta gente! — sussurrou a sua vizinha.

— Já não se está em paz em nenhum lugar! — resmungou uma terceira.

De repente, um espesso nevoeiro cobriu o barco.

"Excelente!" disse Fluo para si próprio. "Vou aproveitar para me pôr a milhas!"

E atirou-se de cabeça para o nevoeiro que mais parecia algodão.

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— Vou partir! Estou a voar! Já estou longe! — disse Fluo, voando com toda a força.

— E por que razão te vais embora, Fluo? — resmungou o corvo que dormitava encostado a ele.

— Não querem ver-se livres de mim? — perguntou, inquieto.

— Fluo, deixa-nos dormir! — murmuraram os outros corvos, sonolentos.

— Mas, o que se passa com ele? — perguntaram os que acordaram.

— Ah, meus amigos, se vocês soubessem... Que pesadelo!

— Conta! Adoramos histórias terríveis, sobretudo aquelas que só existem nos nossos sonhos!

E Fluo contou...

— Sim, sim! — exclamou Romualdo. — Essas histórias acontecem todos os dias... Mas não entre os corvos! Somos todos unidos e todos são bem-vindos!

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Carola Holland; Edith Schreiber-Wicke (ill.)
Pas assez noir
Mijade, 1998
(Tradução e adaptação)

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