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Se há algo que recordo da minha infância, são as eternas tardes de verão na aldeia. A luz do sol e os passeios pelo bosque com a minha avó.

A minha avó dizia que eu tinha mãos de pianista. Não é verdade, mas era assim que ela as via. Suponho que as avós têm a capacidade de ver tudo o que de bom há em nós. Tudo aquilo que poderemos chegar a ser.

As suas mãos, em contrapartida, eram grandes, com dedos grossos e toscos. Eram as mãos de alguém que tinha trabalhado a terra desde menina. Eu gostava mais das mãos dela do que das minhas. Eram mãos que pareciam uma casa, um lugar ao qual se regressa.

A minha avó não pôde ir à escola por culpa da guerra. A guerra dos homens, que rouba o direito às crianças. Mas possuía a sabedoria do campo e das estações. Outro tipo de conhecimento que agora estamos a esquecer.

Um dia, enquanto andávamos por trilhos e caminhos, cruzámo-nos com uma víbora. A minha avó ficou nervosa e gritou: «Pisa-a, pisa-a!» Quando, na verdade, queria dizer precisamente o contrário!

Eu deixei a serpente em paz e, assim, também a serpente nos deixou em paz.

Todos, por vezes, cometemos erros. Incluindo as avós. Ao longo dos anos, apesar das distâncias, dos telefonemas, dos quilómetros, do tempo... voltámos a passear juntos, e recordávamos aquele dia em que nos tínhamos cruzado com uma víbora. Ambos ríamos e a minha avó dizia:

— Eu jamais diria uma coisa dessas! Teria dito, de preferência, «Deixa-a ir, deixa-a ir!»

E eu arreliava-a, e pensava nas suas bonitas mãos, mãos que pareciam uma casa. Um lugar ao qual se regressa.

Adolfo Serra

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