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Saí, andando pelas ruas da cidade, a observar as pessoas e as coisas. Precisava fazer alguma coisa diferente, sair da rotina monótona que era minha vida. Meu dinheiro e tudo o que poderia conseguir com ele não tiravam a solidão, o vazio que havia dentro de mim. Eu andava, olhava para tudo, como se procurasse algo, sem no entanto saber o que. Era véspera de Natal e talvez por isso, pela aproximação de mais um fim de ano árido, sem uma família, eu saíra a esmo.
As calçadas, muito movimentadas, eram um tumulto de pessoas apressadas num vaivém constante, num entra-e-sai das lojas para ultimar as compras de Natal. Parei em frente de uma vitrine com brinquedos de todos os tipos, enfeites mil, luzinhas multicores faiscando em todos os cantos, notadamente em uma arvorezinha artificial. Ao meu lado, uma garotinha. Criança pobre, deduzi, pelas roupas rotas e pés descalços. Em seu rostinho redondo, brilhavam dois olhinhos vivos e azuis, que percorriam avidamente todos os objetos expostos.

Talvez percebendo minha atenção sobre ela, olhou rapidamente para mim, voltando em seguida a admirar os brinquedos. Mas voltou-se novamente, exclamando com aquela singeleza tão peculiar da infância:
- Quanta coisa bonita, né, seu moço?
- É, muita coisa bonita - respondi. - Você já pediu ao Papai Noel o que deseja ganhar neste Natal?
Ela baixou os olhos.
- Sabe, eu queria ganhar tanta coisa, mas sei que não vou ganhar nada. Acho que Papai Noel não vai me atender, mesmo, como das outras vezes. Você conhece Papai Noel?
- Conheço, sim.
- Você conhece? - uma sombra de dúvida passou pelo rosto da garotinha, mas o entusiasmo foi maior e ela preferiu acreditar.
O brilho dos olhos aumentou. - Que bom! Quem sabe se o senhor falasse com ele...
Abaixei para falhar-lhe em tom de confidência, na altura do seu ouvido:
- Bem, eu vou contar um segredo, que deve ficar só entre nós dois, certo? Eu sou Papai Noel. Só que estou disfarçado, entende? E você, como se chama?
- Eu sou Ninete - ela voltou a ficar intrigada - mas você é mesmo Papai Noel? Não tem barba branca, nem aquela roupa vermelha...
- É, meu bem, sou o Velhinho do Natal, só que preciso sair assim, às vezes, para conhecer garotinhas como você. Para eu saber de coisas como essas que está me contando, que não podem acontecer. Então você acha que seu pedido não seria atendido? Por quê?
- Nos outros anos, o Velhinho não veio para me trazer presentes. E mamãe, coitada, não podia me dar nada... Papai morreu, sabe? Faz muito tempo. E nós, mamãe e eu, somos pobres. Se eu pudesse, levava tudo isso para nós! - e levantou os braços, como se tentasse abraçar todos os brinquedos.
- Pois olhe, - disse-lhe eu - pode esperar o Papai Noel esta noite, que ele vai visitar você.

Peguei-a pela mão e, caminhando na direção de outra loja, propus-lhe:
- Vamos fazer umas compras para que você espere o Velhinho mais bonita do que já é, está bem?
Ninete ficou indecisa.
- Mas... você vai comprar?
- Claro. Eu não lhe disse que sou o Papai Noel disfarçado? Para mim é muito mais barato...
Era muito bom ver o brilho de alegria nos olhos e no sorriso de Ninete, ao escolher, para si, coisas que nunca tivera antes.
Ao sairmos da loja, saltitando com embrulhos nas mãos, era a própria imagem da felicidade.
- Eu posso ajudá-la a levar suas compras, Ninete? Onde você mora?
- Você quer ir comigo? - De repente, ela se deu conta de que teria que explicar a sua mãe como conseguira todos aqueles pacotes.
- Não é muito longe. Eu lhe mostro. Nossa casa não é bonita, mas quero que mamãe o veja.
- Então vamos.

Quando chegamos, a mãe de Ninete ficou assustada com tudo aquilo: um homem chegando com sua pequena, pacotes, já dissera para a filha cuidar com estranhos. Explicamos e é óbvio que ela não acreditou que eu fosse Papai Noel, mas aos poucos convenceu-se de que não havia perigo.
Afinal, era Natal...
Então preparamos tudo para a chegada do Velhinho dos Presentes.

À noite, quando voltei, Ninete fez grande festa. Ela estava feliz.
No entanto, não esquecera de que lhe tinha dito ser Papai Noel. Aproximou-se mais, abraçou-me e puxou a barba postiça, exclamando:
- Você é mesmo Papai Noel!

Aquele não seria, para mim, um Natal como os outros. Nem para Ninete. Eu não estava sozinho: encontrara uma família. Emprestada, sim, mas uma família para me ajudar a ter um Natal de verdade. O sorriso de Ninete, sua alegria contagiante, eram os maiores presentes que eu poderia ter.
Papai Noel fora generoso connosco...

Conto de Luiz Carlos Amorim
Fonte: http://br.geocities.com/prosapoesiaecia/umpapainoelcontos.htm

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Comentário de Conceição Valadares em 11 dezembro 2018 às 11:01

Linda historia de amor! Obrigada amiga

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