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Que vivemos em uma sociedade mercantilista e consumista não nos restam dúvidas.
Vive-se para o consumo atormentados pela busca constante de uma sensação de bem-estar, que acabamos por chamar de felicidade, mas é como tentar matar a sede bebendo água do mar.
Erich Fromm, humanista e grande cientista do comportamento humano, já apontava, nos anos setenta do século vinte, que:
“A satisfação irrestrita e todos os desejos não é conducente ao bem-estar, nem é a via para a felicidade ou mesmo para o máximo prazer.” (1)
Mas, seria condenável buscarmos o nosso próprio bem-estar? É evidente que não, e todos os seres vivos o fazem incessantemente, e o assunto também foi de interesse de Allan Kardec, que questionou os Espíritos Superiores:
“É condenável ao homem procurar o seu bem-estar?
– O bem-estar é um desejo natural. Os abusos são condenáveis porque contrariam a lei de conservação. O bem-estar é condenável se foi adquirido à custa dos outros e se comprometeu o equilíbrio moral e físico do homem”. (2)
Depreende-se da resposta que os excessos são prejudiciais ao ser humano, e que está em seu livre arbítrio o controle de seu bem-estar e a consequente percepção de felicidade.
A esse respeito os Benfeitores Espirituais responderam ao questionamento de Allan Kardec:
“A civilização, ao criar novas necessidades, não é a fonte de novas aflições?
– Os males desse mundo ocorrem em razão das necessidades falsas que criais. Aquele que sabe limitar seus desejos e vê sem inveja o que está acima de si poupa-se das decepções nessa vida. O mais rico dos homens é aquele que tem menos necessidades”. (3)
Assim, quanto mais nos inclinamos ao consumo material e à vida de aparências, mais nos afligiremos espiritualmente, e é nesse sentido que Allan Kardec inseriu em O Evangelho segundo o Espiritismo esclarecedora mensagem ditada pelo Espírito Fénelon, intitulada “Os tormentos voluntários”:
“O homem está incessantemente à procura da felicidade que lhe foge sem parar, pois a felicidade pura não existe na Terra. Entretanto, apesar dos sofrimentos que formam o desfile inevitável desta vida, ele poderia pelo menos desfrutar de uma felicidade relativa se não condicionasse essa felicidade às coisas perecíveis e sujeitas às mesmas contrariedades, ou seja, aos prazeres materiais, ao invés de procurá-la nos prazeres da alma, que são uma antecipação dos prazeres celestes imperecíveis. Ao invés de procurar a paz do coração, única felicidade real aqui na Terra, é ávido por tudo aquilo que pode agitá-lo e perturbá-lo e, coisa curiosa, parece criar propositadamente tormentos que dependia só dele evitar.
Haverá maiores tormentos do que aqueles causados pela inveja e pelo ciúme? Para o invejoso e o ciumento não há repouso: estão sempre excitados pelo desejo, o que eles não têm e os outros possuem causa-lhes insónia. O sucesso de seus rivais lhes dá vertigem; seu único interesse é o de menosprezar os outros, toda a sua alegria está em excitar, nos insensatos como eles, a ira do ciúme de que estão possuídos. Pobres insensatos, de fato, nem sonham que talvez amanhã será preciso deixar todas essas futilidades cuja cobiça envenena suas vidas! Não é para eles que se aplicam estas palavras: Bem-aventurados os aflitos, pois serão consolados, visto que suas preocupações têm recompensa no Céu.
De quantos tormentos, ao contrário, se poupa aquele que sabe se contentar com o que tem, que vê sem inveja aquilo que não é seu, que não procura parecer mais do que é. Ele está sempre rico, pois, se olha abaixo de si, ao invés de olhar acima, verá sempre pessoas que têm menos. É calmo, pois não cria necessidades ilusórias, e não é a calma, em si mesma, uma felicidade em meio às tempestades da vida?” (4)
Pensemos nisso.
António Carlos Navarro
Referências:
(1) Erich Fromm, Ter ou Ser?;
(2) Allan Kardec, O Livro dos Espíritos, item 719;
(3) Allan Kardec, O Livro dos Espíritos, item 926;
(4) Allan Kardec, O Evangelho segundo o Espiritismo, cap. V.
Os grifos são do autor do ensaio.
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